17 de set. de 2010

Procura-se bom jornalismo!

Na universidade, tem um professor, do qual sou aluno, que diz: "hoje fazemos um tipo de jornalismo que não incomoda ninguém". Para ele, os jornalistas atuais fazem somente matérias positivas sobre qualquer tema, de qualquer editoria - cultura, economia, política, etc. 

Discordo em parte, pois os jornalistas têm atuados sob duas vertentes: a primeira, relacionada ao negócio das empresas, que está em estagnação e até mesmo em falência. 

A versão impressa do Jornal do Brasil (JB) já deu o seu "adeus" as bancas. O jornal que fez sucesso nos anos 70 e abrigou  jornalistas do calibre de Tutty Vasques e Alberto Dines, sucumbiu. Saiu da UTI com sepultamento destinado. Agora sua "alma" vaga pela rede virtual. 

O JB e outros conglomerados procuram a solução na web. Mudaram a plataforma; a lógica do negócio é a mesma. Fadado ao fracasso novamente.

A segunda vertente se refere ao engajamento político-partidário dos profissionais, para os dois lados - esquerda e direita. De forma exacerbada, os colegas da grande mídia fazem à revelia das leis eleitorais, oposição escancarada, disfarçada de "liberdade de imprensa", ao governo. E apoiam, também disfarçado de "imparcialidade", o candidato da oposição.

Trocando em miúdos: o objetivo é eleger José Serra e derrotar Dilma Rousseff. E para isso vale tudo, até mesmo burlar a legislação eleitoral.

Esse mesmo professor acredita que é possível ser imparcial, objetivo e claro em uma matéria jornalística. De fato, é possível chegar a esse patamar. Para isso é necessário ter em mente três elementos fundamentais:

1) domínio da língua portuguesa e das técnicas jornalísticas. Para isso, o diploma torna-se um parâmetro mínimo para obter esse domínio. Repito: parâmetro mínimo;

2) Fazer uso consciente das informações que, graças a internet, estão disponíveis gratuitamente via web e; 

3) Ter honestidade intelectual consigo mesmo.

Dominar a língua portuguesa e escrever bem, qualquer indivíduo que pratique o hábito da escrita consegue. O que difere um escritor de um jornalista, não é somente o que ele escreve, mas como ele escreve. 

O jornalista, assim como um escultor, consegue dar as mais variadas formas para um texto, sem perder os três pilares fundamentais da notícia: informação, interpretação e opinião.

É possível passar uma informação e ser objetivo? Sim, isso é possível. Além de dominar a língua e as técnicas, o jornalista que possui diferencial utiliza as informações de forma adequada. 

Analisa, descontrói e também compara dados e informações. Com isso, ele constrói um raciocínio, que pode ser ou não ser: a decisão ficará ao leitor. Contudo, cabe ao jornalista propor debate sobre temas "cabeludos", mesmo que sua religião ou crença filosófica sejam contra. O jornalista é um "especialista em especialistas", segundo o docente de quem sou discente. E com orgulho.

Por fim, a honestidade intelectual significa que é impossível aprender e saber tudo sobre o mundo do conhecimento. Impossível sim é ignorar nossa capacidade intelectual e o pior: ignorar a capacidade do outro.

O desvio de honestidade intelectual se vê quando os meios de comunicação pronunciam, de forma velada, o preconceito contra o atual Presidente da República pelo fato de não saber falar inglês. Entretanto, ignoram sua capacidade política, de negociação e de persuasão. 

A sinergia entre o seu discurso aparentemente "tosco" e seu público-alvo - uma massa desorganizada politicamente e desamparada socialmente - não foram captadas pela mídia, que hoje custa a entender por qual motivo um trabalhador com ensino técnico chegou ao Palácio do Planalto e sairá dele com 80% de aprovação.

O êxito de Lula vai além das políticas públicas e da mobilização social promovida em seu governo. Sua popularidade está também relacionada com a capacidade de domínio do signo linguístico, que converge para a população mais carente, conhecida pejorativamente como "povão".

A loucura e a perda gradativa de domínio sobre o noticiário, com o advento da internet e das redes sociais, leva alguns veículos e jornalistas a adotarem uma postura equivocada diante da realidade. Aos poucos, a grande mídia deixa de ser espelho da realidade para construir sua própria realidade.

Isolada do contexto socioeconômico que vive o Brasil, Globo, Folha, Veja, Estadão e outros conglomerados midiáticos se agarram com unhas e dentes a esse ideal: levar Serra ao poder.

Rasgaram os manuais de jornalismo, os códigos de ética, as legislações de comunicação e a Constituição. O casal Bonner, símbolo da imparcialidade na televisão brasileira, perdeu a (com)postura na sabatina com Dilma Rousseff, no dia 09 de Agosto.

William Bonner, apresentador moderado, equilibrado e elegante, surge enfurecido e descontrolado. Seu ímpeto raivoso precisou ser contido pela esposa e também âncora do JN, Fátima Bernardes, que deu nas entrelinhas o tom do debate: "William, você está exagerando".

No dia seguinte - 10 de Agosto - na sabatina com José Serra, o tom era de conversa de botequim: bate-papo descontraído e sem cortes. A equipe de cerimonial do JN deixou a desejar na distribuição de café e bolachas para a o "tea party" em pleno horário nobre: faltou mais.

Depois dos quatro debates, algo ficou nítido para o telespectador: a máscar caiu. A pouco dignidade que ainda do telejornal mais famoso do Brasil desapareceu suave, descompromissada e atrevida como água indo para o ralo.

A situação se tornou insustentável, que correligionários do governo, como José Dirceu, pedem intervenção na imprensa. José Serra, de seu modo, constrange jornalistas quando fazem perguntas sobre temas incômodos, como pedágios, escândalo Verônica Serra e o resultado das pesquisas. A imprensa se tornou "menina de recado" da esquerda e da direita. 

A opinião do professor, acredita esse ordinário blogueiro, pode estar em discordância, pois a mídia tem se engajado para incomodar certas pessoas e setores. O lamentável é que isso só aconteça de um lado das classes sociais. 

Quanto a interferência nos meios, ese ordinário blogueiro acredita que a internet anarquizou as relações de poder e de hierarquia da informação. Tem espaço para a mídia neste cenário, mas é difícil reveter o que está se consolidando no meio impresso: falência no modelo de negócios aplicado ao jornaismo e jornalistas.

Para melhorar a mídia e o jornalismo no Brasil, não é necessário interferência. A fórmula para mudança é simples: aumentar a liberdade de imprensa e diminuir a liberdade de empresa.  

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